Os primeiros passos da presidente Dilma Rousseff serão determinantes para demonstrar se ela está ou não disposta a cair em ciladas. Se os próximos quatro anos serão marcados pelo “capitalismo dos amigos” ou se ela pretende repensar a participação do estado na economia e investir nas bases que oxigenam o sistema. Se ela parte de uma visão estratégica com valores que alimentam a livre iniciativa ou se a coisa vai rolar ao sabor do vento e do compadrio.
Durante a campanha, Dilma se pautou por teses retrógradas sobre desenvolvimento nacional e defendeu mais estado onde deveria defender mais iniciativa privada, defendeu mais controle, onde deveria defender regulamentação e transparência. Criticou as privatizações com base em inverdades, dando a entender que está mais para o discurso populista, para o capitalismo de cabresto do que para a economia moderna, que convida os investidores ao desenvolvimento responsável.
Campanha é campanha. Governo é governo. Lula sabe disso como ninguém e navegou ao longo dos seis primeiros anos de seus mandatos em um mar tranqüilo, sem sobressaltos, usufruindo da herança bendita de Fernando Henrique Cardoso e de uma economia internacional azeitada. Mesmo assim, ajustou o discurso para reduzir a cinza seus adversários políticos, tentando projetar no tempo a idéia de que era ele a entidade suprema e a justificativa do bem estar geral.
Nem mesmo o fisiologismo, os mensaleiros e o aloprados conseguiram macular sua imagem. Deixa o governo com popularidade nas nuvens e com grandes chances de disputar novamente o poder daqui a quatro anos. Dilma não inicia seu governo nas mesmas condições e são poucos os analistas que apostam na possibilidade de ela se dar bem mantendo discursos falaciosos como os de Lula. No caso do presidente que sai, até mesmo os ataques da oposição o fortaleciam. Não deve ocorrer o mesmo com sua sucessora. Isso não significa que os ataques virão da oposição, mas de sua própria base.
Celso Ming, do Estadão, observou que Dilma leva a vantagem de não iniciar seu governo sem a crise de confiança que marcou a ascensão de Lula. No entanto, a realidade é bem mais dura e não haverá margem para elucubrações fajutas. A presidente terá ainda que dobrar a selvageria petista e peemedebista. Evitar novos escândalos e enfrentar as incertezas externas. O pensamento mágico dos últimos oito anos deve dar lugar a um pragmatismo de resultados, em um ambiente internacional e doméstico que exige clareza sobre as dificuldades.
Os investimentos em infraestrutura (PAC) exigirão a primeira mudança no discurso estatizante, porque não há mais os recursos do Tesouro e do BNDES para tanto e o capital privado terá que ser convocado para a missão. Como fazer isso sem se contradizer o que foi defendido na campanha anti-privatista? Novamente, pode-se dizer que campanha é campanha. Governo é governo. Mas não deixa de ser um amadurecimento para o PT e necessidade de ajuste em seus discursos de fachada.
Outro ponto que já chama a atenção é a inflação. Um mal que exige ações determinadas e, muitas vezes, impactantes, de baixo apelo popular. O cambio, as exportações e seus efeitos colaterais também colocarão Dilma diante de uma imensa pauta de reformas. E quando se fala em reformas, o tempo é ontem. Não podem ser adiadas sob o risco de não saírem do papel. A síntese da ópera é que Dilma não terá margem para criticar seu antecessor e nem poderá usar desse expediente, como fez Lula. Não lhe cairá bem as metáforas rústicas sobre futebol para justificar a conjuntura. Terá que trabalhar duro e com as ferramentas conhecidas por todos, sem margem para apelação e subterfúgios. O desafio é imenso.
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